
“As obras daquele que não se locomove, mas sonha com o que rola no mundo, trazem um colorido intenso e traduzem a brasilidade popular em jogos circenses, cenas domésticas, ritos religiosos e amorosos”. Dessa maneira Priscila Freire, curadora da exposição “Marcos Garcia - O Acrobata das Cores”, descreve as telas que compõem a nova mostra do Centro de Arte Popular – Cemig, integrante do Circuito Liberdade, que será inaugurada em 28 de abril (quinta-feira), às 20 horas.
Uma seleção de 50 quadros inspirados em nomes como Carybé, Tarsila do Amaral e Aldemir Martins trazem ao espaço museológico, vinculado à Secretaria de Estado de Cultura, referências plásticas que nos colocam frente a um universo onírico que ganha materialidade pelas técnicas de lápis aquarelável e caneta esferográfica sobre cartão e papel.
A pintura geométrica e figurativa de Garcia é bastante autoral, segundo a colecionadora. “Marcos Garcia não é um primitivo, tampouco um artista espontâneo. Poderíamos reconhecer nele o oposto das novas tendências estéticas, porque encontra dentro de si um conteúdo rigidamente construído”, defende Freire.
A curadora acredita que desenhos eróticos aparecem nas telas de Garcia como um testemunho da própria trajetória da arte e da vida. “Não conheço nenhum artista que não tenha, em algum momento, se dedicado a esse tema. Picasso, Degas, Rodin, a humanidade se compraz nos jogos amorosos”, comenta.
O pintor de 66 anos tem uma crescente dificuldade de locomoção desde a sua infância. Aos seis anos, Marcos Garcia contraiu Artrite Reumatoide, uma doença crônica e degenerativa. Momentos pregressos a essa condição são traços indissociáveis de sua obra. “Meu trabalho tem como fonte de inspiração as lembranças do tempo em que eu podia vivenciar o dia a dia das pessoas”, conta Garcia.
Entusiasmado com a realização da mostra, o artista expressa sua expectativa. “Esta exposição me possibilitará rever velhos amigos e compartilhar minha arte em um espaço que valoriza o trabalho dos artistas populares de Minas Gerais. Tenho ainda mais orgulho por estar sob a curadoria de Priscila Freire, grande amiga e incentivadora”, comemora o pintor.
A mostra Marcos Garcia - O Acrobata das Cores tem entrada gratuita e ficará em exposição na Sala de Exposições Temporárias do Centro de Arte Popular - Cemig entre os dias 29 de abril e 29 de maio de 2016.
Conheça algumas das obras que compõem a exposição. As imagens são de Cristiano Quintino.
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SOBRE O ARTISTA
Marcos Garcia nasceu em Belo Horizonte, em 1950. Artista plástico, estudou na Escola Guignard. Obteve o 3º lugar no V SAP da Aeronáutica, (BH- 1989); Participou do Salão do Carnaval, no Palácio das Artes, (BH-1980); II Salão do Futebol, Palácio das Artes (1982); II Salão de Artes da Aeronáutica, (BH-1986); Salão Nacional de Montes Claros, MG, (1988) e da Bienal de Arte Naïfis do Brasil, Piracicaba, SP (1998). Esteve também nas seguintes coletivas: Retrospectiva dos Premiados no Salão da Aeronáutica, (1990); Utopias Contemporâneas, Palácio das Artes (BH-1992); PIC (BH-1993-94); Centro de Arte Primitiva (Brasília-1994); Centro Cultural Pró-Música, Juiz de Fora, MG (1995); Artistas Populares de Belo Horizonte, Centro Cultural UFMG (1996); Primitivos Mineiros, Galeria de Arte Sesiminas, BH (1997); Cinco Artistas - Projeto Gabinete de Arte, Gabinete do Prefeito, BH (1997); Segredo de Estado, Palácio das Artes e Biblioteca Pública, BH (1997).
SOBRE A CURADORIA
Formada em Biblioteconomia, na UFMG (1951), Priscila Freire é fundadora, coordenadora, professora e diretora do Teatro Escola. Como atriz atuou em montagens inspiradas em Strindberg, Pirandello, Brecht. No cinema atuou em filmes de João Vargas, Santos Pereira, Paulo Augusto Gomes e Olívio Tavares de Araújo. É autora dos livros Conversa de Corpo (1983), A Viagem do João de Barro (1994) e Histórias de Guignard (2000). Como gestora cultural foi superintendente de Museus do Estado de Minas Gerais (1983), presidente da Associação Amigas da Cultura (1981), coordenadora do Sistema Nacional de Museus (1987), diretora do Museu de Arte da Pampulha (1993 – 2001 a 2009), assessora do Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico – IEPHA (1990), presidente da Associação de Amigos do Museu Casa Guignard de Ouro Preto (1999 – 2005) e integrante do Conselho do Centro de Arte Contemporânea Inhotim – CACI / Brumadinho.
Leia, na íntegra, texto de Priscila Freire sobre a exposição "Marcos Garcia - O Acrobata das Cores".
O acrobata das cores
Priscila Freire
Em casa, sem poder se locomover, Marcos começa, ainda criança, a ilustrar os cadernos de desenho de seus irmãos. Feliz distração para quem não pode correr atrás de uma bola. Pode, sim, sonhar com o que rola no mundo lá fora. Nem livros nem revistas para alimentar sua imaginação. Mas não lhe falta o talento para perceber o que haveria além daquelas paredes. Lembro-me de seus primeiros quadros e como os trazia dificultosamente pelas ruas, quando o conheci. Figuras humanas e de santos com braços curtos e mãos mal delineadas. Marcos se redesenhava, ainda sem a feérie que viria posteriormente envolver seu trabalho.
Uma coluna assinada por Mari’Stella Tristão, no “Estado de Minas”, estimula a carta que Marcos lhe escreve e tem como resultado uma visita da crítica de arte, que o encaminha para a Escola Guignard. Uma bolsa de estudos ou mais precisamente a condição de ouvinte ou assistente, desde que não haveria pagamento. Na época, Amilcar de Castro conduzia a Escola que não contava mais com o mestre que lhe deu o nome. Acompanha a artista Lotus Lobo, mas não tem a força necessária para trabalhar a pedra. A litografia estava fora de seu alcance. O professor Carlos Wolney lhe ensina desenho livre, e ele quer a pintura marcada, delineada, com tintas sem mistura, de colorido brasiliano, como definiu Maria do Carmo Arantes.
Marcos Garcia não é um naif, nem um primitivo, tampouco um artista espontâneo. Poderíamos reconhecer nele o oposto das novas tendências estéticas, porque encontra dentro de si um conteúdo rigidamente construído. Sua pintura é figurativa, equilibrada em composições muitas vezes geometricamente conduzidas, plana e rica em detalhes cujas perspectivas formais são ignoradas. As obras trazem um colorido intenso e traduzem a brasilidade popular em jogos circenses, cenas domésticas, ritos religiosos ou amorosos. Em particular, ele redesenha temas de seus artistas preferidos e os coloca em pequenos detalhes: Carybé, Tarsila e Aldemir Martins. Também em sua pintura surgem referências a um mundo mágico e mitológico que nos colocam frente a um universo complexo e onírico. Vemos enfaticamente sua determinação em atingir processos técnicos cada vez mais elaborados.
Selecionei para esta exposição alguns desenhos de cunho erótico que fazem parte de sua produção artística. Não conheço nenhum artista que não tenha, em algum momento, se dedicado a esse tema. Picasso, Degas, Rodin, sem falar das fantásticas ilustrações eróticas japonesas e do Kama Sutra, em relevo nos templos indús. Trata-se da energia vital inerente ao ser humano exposta nas mais antigas representações pictóricas da História, do ano 5.000 antes de Cristo até os dias de hoje. A humanidade se compraz nos jogos amorosos e aqui eles aparecem como testemunho da própria trajetória da arte e da vida.
SOBRE O CENTRO DE ARTE POPULAR – CEMIG
Espaço privilegiado de divulgação e apreciação do trabalho de artistas populares de todo o Estado de Minas Gerais, o acervo do museu conduz o visitante ao imaginário de diferentes artistas. Por meio de suas obras, somos conectados às origens, histórias e crenças de um povo que traz nas mãos um sincretismo cultural próprio.
Em seus dois primeiros andares, o Centro de Arte Popular – Cemig abriga salas que retratam a arte popular mineira. Seu acervo é organizado por materiais, temas e cronologia, onde o visitante pode conferir esculturas em madeira e em cerâmica, telas, teares. Mídias, som e imagem tornam as exposições ainda mais dinâmicas e interativas, e ajudam na contextualização dos temas, mostrando ao visitante uma dimensão mais ampla e profunda do histórico cultural de cada região.
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SERVIÇO
Exposição: “Marcos Garcia - O acrobata das cores’’
Período de visitação: 29 de abril a 29 de maio de 2016
Local: Centro de Arte Popular – Cemig – Sala de Exposições Temporárias
Endereço: Rua Gonçalves Dias, 1.608 - Lourdes
Horário: às terças, quartas e sextas-feiras, das 10h às 19h | às quintas-feiras, das 12h às 21h | aos sábados e domingos, das 12h às 19h
Informações: (31) 3222-3231